Como prometido, aqui ficam três testes sobre o romance «Os Maias», de Eça de Queirós, com respostas para cada uma das perguntas.
Teste 1 - cap. VI (Carlos da Maia vê pela primeira vez Maria Eduarda Runa. É apresentado a Dâmaso Salcede. O jantar no Hotel Central vai ter início.)
Teste 2 - cap. I (Pedro da Maia conhece Alencar, que lhe vai dizer quem é Maria Monforte e o pai.)
Teste 3 - cap. VIII (Carlos da Maia vai em passeio a Sintra, com Cruges, tentando aí encontrar Maria Eduarda.)
segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008
Testes sobre «Os Maias»
quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008
Uma breve análise de «Os Maias»
O Estilo
Foi, contudo, talvez como estilista que Eça mais se impôs na Literatura Portuguesa. Efectivamente, é com ele que um sopro arejado e vivificador vem renovar a Língua Portuguesa que perde, porventura, em vernaculidade e em pureza, mas ganha em maleabilidade e possibilidades expressivas. Amadurecida a partir de Vieira, a Língua Portuguesa apresenta, por assim dizer, a mesma grave fisionomia durante os séculos XVIII e XIX, excepção feita a Garrett. A partir de Eça de Queirós, vemo-nos, finalmente, na posse duma língua dúctil, aligeirada, adaptada às necessidades modernas da expressão.
- uso do discurso semidirecto, que assim se transfere para um plano de objectividade analítica;
- desnivelamento da adjectivação (hipálage), isto é: a um substantivo concreto atribui uma qualidade de ordem abstracta; a um ser inanimado confere atributos humanos, e vice-versa: "monte facundo de jornais", "luz pensativa", "adro grave", etc. Este aspecto confere à sua prosa um tom inesperado e surpreendente;
- uso do estilo impressionista, com a notação de sensações que, sugeridas ao leitor, lhe permitem reconstituir a realidade: as suas descrições de paisagens e ambientes são feitas, sobretudo, através de indicação de cores, tonalidades, ruídos, aromas, sensações de quente, frio, etc. (presente frequentemente na descrição).
- indicação do pormenor material: "cruz de pedra", "corrente de ferro", etc.;
- capacidade de criação imagética que confere à sua linguagem (um tom poético).
Quanto às personagens, procede identicamente: é através do vestuário, dos ademanes (as "maneiras" das personagens), da linguagem, das ideias expressas que nós, leitores, reconstituímos uma dada personagem. Desse modo, tal como na vida real, não é logo ao primeiro contacto que nos é delineada a personalidade em questão; mas é no decorrer do entrecho, depois de intervenções sucessivas, que nos é permitido travar conhecimento cada vez mais completo com cada personagem. Pouco a pouco, depois de encontrarmos uma vez e outra João da Ega, e outros, é que se nos vai desvendando o respectivo carácter.
ORIGEM DO REALISMO (NATURALISMO)
a) NA EUROPA
Assim como o Romantismo se radicou no Idealismo filosófico, assim também agora o Realismo tem suas raízes filosóficas no positivismo de Stuart Mill e de Augusto Comte e no experimentalismo de Claude Bernard. A literatura, assim como toda a arte, bebeu desta filosofia o gosto do real e da percepção sensorial rigorosa, que viria a eliminar ou pelo menos a reduzir a influência subjectiva do escritor (observador). O primeiro escritor a ser apelidado de realista foi Flaubert, o qual, em obras como Madame Bovary e Education Sentimentale, criticou a educação romântica, apontando os defeitos da sociedade num tom de imparcialidade e impassibilidade. Apareceram as descrições minuciosas das paisagens e dos ambientes sociais, numa linguagem correcta e equilibrada, de imagens expressivas e ao mesmo tempo nítidas.
Émile Zola, o maior representante da escola naturalista, em atitude científica própria da época, procura explicar à luz do determinismo do meio e da hereditariedade o comportamento das personagens dos seus romances.
O Naturalismo rígido, que defendia que os romances deviam ser a imagem da realidade nua e crua, usando processos verdadeiramente científicos, depressa daria lugar a um Realismo impressionista, que, embora partindo da vida real, daria também lugar à imaginação e ao devaneio, enfim, uma espécie de segundo Romantismo. Esta evolução teve origem no psicologismo de Tolstoi e Dostoievski e foi ter às correntes anti-racionalistas estetizantes dos simbolistas e dos decadentistas (Oscar Wilde, Mallarmé, Rimbaud, Verlaine, etc,).
b) EM PORTUGAL
O caminho de ferro que em meados do séc. XIX já ligava Paris a Coimbra e esta a Lisboa e ao Porto, foi veículo das novas ideias e da nova literatura, cujo centro de irradiação era a capital da França. Michelet, Proudon (socialismo utópico), Vitor Hugo, Musset, o positivismo de Comte e o evolucionismo de Darwin é que orientavam os novos homens, a maior parte deles formados em Coimbra: Antero de Quental, Eça de Quelrós, Teófilo de Braga, Oliveira Martins, Batalha Reis, etc.
Há três realidades que é preciso considerar para se compreender a transformação ideológica e literária operada nesta segunda metade do séc. XIX em Portugal: a Geração de 70, a Questão Coimbrã e as Conferências do Casino.
A GERAÇÃO DE 70
Deu-se este nome a um conjunto de intelectuais, escritores, que se afirmaram entre 1861 e 1871, impondo em Portugal um novo caudal de ideias e novos modelos literários vindo da Europa, que revestiram então em Portugal aspectos de uma verdadeira revolução artlstica e cultural.
Da Geração de 70 fazem parte Antero de Quental, Eça de Queirós, Oliveira Martins, Teófilo Braga, Ramalho Ortigão, Batalha Reis, etc. Foram alguns destes homens que tomaram parte na Questão Coimbrã e organizaram as Conferências do Casino.
A QUESTÃO COIMBRÃ
Dá-se este nome a uma verdadeira guerrilha que surgiu quando Pinheiro Chagas, poeta romântico, publicou Poemas da Mocidade, dedicado a Castilho e que este elogiou de tal forma que propunha o seu autor para professor de literatura no Curso de Letras da universidade, ao mesmo tempo que fazia insinuações contra Antero de Quental. Este respondeu violenta e grosseiramente com o folheto Bom Senso e Bom Gosto, onde, entre outras expressões descorteses contra o velho e respeitável mestre Feliciano de Castilho, se destaca esta: "V. Excia. precisa menos cinquenta anos de idade, ou então mais cinquenta de reflexão".
Os escritores dividiram-se em dois grupos, uns apoiando o velho Feliciano de Castilho, outros, o jovem poeta Antero de Quental. Pinheiro Chagas e Camilo escreveram a favor de Castilho; Teófilo Braga, Eça de Queir6s e outros apoiaram Antero. A Questão Coimbrã terminou com um duelo entre Antero e Ramalho Ortigão, o qual, embora concordasse com as ideias de Antero, o atacou por ter sido descortês para com o velho Castilho.
A Questão Coimbrã não teria grande importância se ela não simbolizasse a luta entre dois grupos de escritores: os românticos e os realistas.
AS CONFERÊNCIAS DO CASINO
Foram organizadas por Antero, Eça, Teófilo de Braga e outros. Antero fez a apresentação das conferências, indicando o vasto campo que elas focariam: Filosofia, arte, literatura, política, religião, etc., isto é, tudo o que pudesse interessar ao homem português de então.
A primeira conferência, sob o título Causas da Decadência dos Povos Peninsulares nos últimos três Séculos, foi pronunciada por Antero, o qual, em atitude demolidora, atribui a alegada decadência ao colonialismo, à acção da Igreja Católica saída do Concílio de Trento e ao absolutismo régio. Mais conferências se realizaram e Eça de Queirós, numa delas, focou o tema O Realismo Como Nova Expressão de Arte, onde traça as normas do romance realista. "O Realismo é a negação da arte pela arte; é a proscrição do convencional, do enfático, e do piegas. É a abolição da retórica considerada como arte de promover a comoção usando da inchação do período, da epilepsia da palavra, da congestão dos tropos. É a análise com o fito na verdade absoluta. Por outro lado, o Realismo é uma reacção contra o Romantismo: o Romantismo era a apoteose do sentimento; o Realismo é a anatomia do carácter. É a crítica do homem. É a arte que nos pinta a nossos próprios olhos para condenar o que houver de mau na nossa sociedade".
Como se vê, o Realismo foi uma reacção clara contra o Romantismo.
«Os Maias» em áudio
Nesta ligação pode-se ter acesso a ficheiros de som de todos os capítulos de Os Maias. No entanto, os ficheiros são Real Audio, em streaming, e a pronúncia é de português do Brasil.
Um blogue sobre «Os Maias»
Análise de «Os Maias», de Eça de Queirós em MP3
Podem encontrar ficheiros de som (em MP3) de análise o romance Os Maias aqui.
Nesta página, um podcast, é também possível ouvir ficheiros sobre o Realismo e o Naturalismo e um enquadramento da época.
segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008
Eça de Queirós - uma curta biografia
Queirós, (José Maria) Eça de (1845 - 1900)
Na obra deste vulto máximo da literatura portuguesa, criador do romance moderno, distinguem-se usualmente três fases estéticas. A primeira, de influência romântica, englobaria as experiências jornalísticas do autor, no âmbito das quais iniciou a observação crítica da sociedade portuguesa, bem como os textos posteriormente incluídos nas Prosas Bárbaras e iria até à publicação de Mistério da Estrada de Sintra, escrito com Ramalho Ortigão. A segunda, de afirmação do Realismo-Naturalismo, iniciar-se-ia com a participação do autor nas Conferências do Casino Lisbonense, teorizando "O Realismo como nova expressão da Arte", e manifestar-seia plenamente nos romances O Primo Basílio e O Crime do Padre Amaro. A terceira, de questionamento e de superação do Realismo-Naturalismo, espelhar-se-ia nos romances A Relíquia e Os Maias e nos semi-póstumos A Ilustre Casa de Ramires e A Cidade e as Serras, nos quais os pressupostos científicos ou deterministas soçobram ante "o manto diáfano da fantasia", a imaginação, o fantástico.
Filho natural de um magistrado, também ele escritor, e depois de uma infância passada fora do lar paterno, Eça vai cursar Leis para Coimbra, em 1861, onde convive com muitos dos futuros representantes da Geração de 70, já então aglutinados em torno da figura carismática de Antero de Quental, e onde acede às recentes ou redescobertas correntes ideológicas e literárias europeias (o Positivismo, o Socialismo utópico, o Realismo-Naturalismo), sem, contudo, participar activamente na que seria a primeira polémica dessa geração, a Questão Coimbrã.
Terminado o curso, Eça inicia a sua experiência jornalística como redactor do jornal O Distrito de Évora e colaborador na Gazeta de Portugal, onde publica muitos dos textos postumamente coligidos no volume das Prosas Bárbaras. No final de 1867, forma-se na casa de Jaime Batalha Reis, em Lisboa, o grupo que ficaria conhecido como o Cenáculo, de que farão parte, nesta primeira fase, além de Eça e de Batalha Reis, Ramalho Ortigão, Oliveira Martins e Salomão Saragga, entre outros.
Após uma viagem pelo Oriente, para assistir à inauguração do canal do Suez, na qualidade de correspondente do Diário Nacional, Eça regressa a Lisboa, onde participa, com Antero de Quental e Jaime Batalha Reis, na criação do poeta satânico Carlos Fradique Mendes e escreve, de parceria com Ramalho Ortigão, o Mistério da Estrada de Sintra.
Em 1871, profere a conferência "O Realismo como nova expressão da Arte", integrada nas Conferências do Casino Lisbonense e produto da evolução estética que o encaminha no sentido do Realismo-Naturalismo de Flaubert e Zola, com influência das doutrinas de Proudhon e Taine. No mesmo ano, inicia, novamente com Ramalho, a publicação de As Farpas, uma série de crónicas satíricas que, servidas por uma ironia e um humor corrosivos, movem um rigoroso inquérito à sociedade portuguesa do período da Regeneração.
Em 1872, Eça inicia também a sua carreira diplomática, no decurso da qual ocupará o cargo de cônsul sucessivamente em Havana (1872), Newcastle (1874), Bristol (1878) e Paris (1888). É, pois, com o distanciamento crítico que a experiência de vida no estrangeiro lhe permite que concebe a maior parte da sua obra romanesca, consagrada ao exame e à crítica da vida social portuguesa, de onde se destacam O Primo Basílio, O Crime do Padre Amaro, A Relíquia e Os Maias, este último considerado a sua obra-prima. Durante esses anos, colabora com crónicas e contos em vários jornais portugueses, como A Actualidade, a Gazeta de Notícias, a Revista Moderna, o Diário de Portugal e a Revista de Portugal, que funda, em 1889.
Morre aos cinquenta e cinco anos, em Paris, deixando um vasto espólio literário que seria publicado nos anos seguintes à sua morte, com "revisões" e correcções apócrifas de amigos e familiares do escritor, revelando um conjunto de textos reconhecidamente distintos da que seria a vontade final do seu autor.